Opinião Série Documental: Who Killed Malcolm X?

SINOPSE: Décadas após o homicídio do líder afro-americano Malcolm X, um ativista embarca numa perigosa missão, em nome da verdade e da justiça.


Sempre adorei o Malcolm X, a sua coragem, eloquência, elegância, aquela revolta pura ante a injustiça da qual também eu sofro... Depois de ver o filme biográfico da sua vida ainda mais fã fiquei, pelo seu passado, a forma como aproveitou a segunda oportunidade que lhe foi dada, a sua imperfeição, pois ele tanto tinha de bom como de mau... não era perfeito... e quem é? 

Agora, com a idade que já tenho e as minhas ideologias formadas, outra forma de ver o mundo, vejo que ele no início, demasiado empolgado e a transbordar de rancor, tentou combater a supremacia branca com a supremacia negra, racismo com racismo, e essas partes dos seus discursos eu não consigo concordar... compreendo perfeitamente a revolta, e concordo com muito o que disse, mas ele, um alegado apologista da justiça, tentou combater a falta dela com mais injustiça por cima...

Nos seus primeiros discursos, e ainda foram uns bons anos deles, esteve quase sempre presente o ataque directo ao: "homem branco", "homem branco", "homem branco", quando até dentro da sua comunidade tinha muitos inimigos negros, ele disse que o que o fascinou no Islão foi o facto de naquela religião não se olhar para as cores da pele, então porque é que ele se focava tanto nisso? Com uma conotação tão negativa para "o homem branco" na generalidade? Porque não se referia apenas à supremacia branca? Quando sempre houve brancos que lutaram contra o racismo? Que lutaram pela libertação dos escravos? Que foram mortos e castigados por isso? Meter todos no mesmo saco não é o que supostamente a supremacia branca faz? Então o que estava ele a tentar fazer? 

"Por todos os meios necessários?" incluindo a injustiça? Injustiçar uns para vingar outros? Havia muita sabedoria e eloquência nos seus discursos, mas também muita raiva e extremismo... e o problema disso não é o discurso em si, mas a forma como inflama os espíritos mais fracos e influenciáveis, que se aproveitam dessa revolta para levar situações ao extremo... 

Chegou a dizer algo como: "Se vieram na esperança de encontrar simpatia para com o homem branco, vieram ao lugar errado", e inclusive atacou durante muitos anos de forma implacável - e algo injusta - o próprio Martin Luther King e as suas manifestações pacificas, dizendo até: "Martin Luther King é apenas um Pai Tomás do séc. XX, que faz o mesmo hoje em dia,  para manter os negros indefesos perante o ataque, que o Pai Tomás fazia na plantação para manter os negros indefesos".

"Está na hora de parar de cantar e começar a retaliar"... a própria religião em que estava inserido, a Nação do Islão é de um extremismo brutal, mas até esse grupo - publicamente - não apelava à violência... Malcolm era uma pessoa vingativa e rancorosa nos primeiros tempos.... fiquei muito chocada com esta sua vertente... e eu compreendo, eu tenho a capacidade de me meter no lugar do outro, mas já aprendi na vida que violência contra violência gera extrema violência que nunca dá em nada e todos saem a perder... mas o que fazer num tempo em que os direitos civis ainda não são para todos e ninguém ouve a nossa voz?

Quando o Kennedy morreu, um presidente amado pelo povo, mais uma vez a intolerância de Malcolm chocou: "(...)Quem semeia ventos, colhe tempestades(...)"... acusava-o de criar climas de ódio, mas o próprio Malcolm semeava ventos constantemente e impulsionava climas de ódio! Como já referi, não há ninguém perfeito, e há quem seja solidário ou apoie uma causa apenas para aproveitamento próprio, económico ou político, mas o que importa é que pelo menos o faça pelo lado certo, de forma a que seja mais vantajoso para todos... Kennedy representava a sociedade branca rica - privilegiados - mas foi responsável pela Lei dos Direitos Civis, que pretendia acabar com a discriminação contra os negros que imperava no país, e mesmo após ser morto essa lei acabou por ser conquistada em 1964  e permitiu que brancos e negros pudessem frequentar os mesmos estabelecimentos. Por sua vez, no ano de 1965, os cidadãos negros americanos obtiveram o direito de voto.

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Depois, quando surgiram as diferenças irreconciliáveis entre ele e o Elijah Muhammad, líder da Nação do Islão, Malcolm sofreu um duro golpe na sua credibilidade, criou muita divisão na segregação, viu-se completamente posto de parte... após a sua peregrinação a Meca, voltou com novos ideais e crenças, fundou a Organização da Unidade Afro-Americana, e veio com uma enorme revolta para com o seu anterior mentor, Elijah Muhammad, afirmando que Elijah havia deturpado o verdadeiro conceito islâmico e além de começar a expor a sua verdade relativamente a esse assunto - que gerou muita controvérsia e ainda mais inimigos -  começou a focar-se nas questões dos direitos civis/humanos de uma forma mais abrangente e menos extremista..., começou a procurar outros apoios, até mesmo os que antes tinha enxovalhado, como o Martin Luther King e outros... e sinceramente, é este Malcolm que eu admiro, esta sua nova transformação, do que quando ele estava sob a alçada da Nação do Islão...

Isto são temáticas complicadas e perigosas, envolvem direitos civis, racismo, brutalidade policial, violação de direitos humanos, polícia e religião fanática militante! Só as duas últimas juntas já é o que é, quanto mais tudo junto...

Este documentário surgiu graças ao trabalho incansável durante mais de 30 anos do Abdur-Rahman Muhammad, que adorava Malcolm X, apesar de ter apenas 3 anos quando Malcolm morreu, mas ficou obcecado em descobrir quem o matou, pois era uma "verdade aberta" que dos 3 que foram presos acusados de o terem matado, apenas um era culpado, os outros dois eram inocentes e quem realmente o matou com uma caçadeira ainda estava à solta passados mais de 50 anos! Abdur-Rahman é um homem integro e corajoso, pois começou a desenterrar verdades que implicavam muitas pessoas com quem não é seguro ninguém se meter, a própria Nação do Islão, o FBI, a polícia de Nova Iorque, o estado, detectives, espiões, infiltrados... e alguns deles aparecem neste documentário, e a forma fria, despreocupada e calculista com que, sem receio de represálias, contam como foi a sua implicação no caso é arrepiante! Juntou imensas provas, registos, vídeos, gravações, testemunhos, um trabalho fabuloso, mas perigoso e esgotante de conseguir, felizmente temos agora o registo nesta série documental.

Uma série que se foca muito na morte de Malcom X, mais do que na sua vida - para isso temos o filme - mas é uma série documental excelente para ver e cada um tirar as suas próprias conclusões.

«A educação é o passaporte para o futuro, o amanhã pertence aos que se preparam hoje»

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