Opinião Filme: Joker

Género: Thriller | Data de estreia: 03/10/2019 | Título Original: Joker | Realizador: Todd Phillips | Actores: Joaquin Phoenix, Robert De Niro, Zazie Beetz | País: EUA | Ano: 2019 | Duração (minutos): 122
Sinopse: Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) é palhaço de profissão. Vive sozinho com a mãe. Sonha ser comediante. Mas Gotham é uma cidade de caos e confusão, que ignora os solitários. Arthur sente-se assim, até conhecer a sensação de ser visto e admirado. E encontra um novo caminho para a sua vida.

O Joker é um dos filmes mais deprimentes que já vi na minha vida... um sufoco de drama e crítica social, é um estalo bem em cheio no meio dos olhos que expõe a podridão da nossa sociedade e dos nossos dias... a pressão social é cada vez mais implacável, exigem cada vez mais ao ser humano, o melhor seria se limitar a ser uma máquina perfeita e discreta... é pura e simplesmente um filme desconfortável de ver, e a parte em que me senti mais à vontade foi quando mais para o final começou a violência a sério, vi quase com alívio, porque comecei mesmo a sentir que a dor do Joker começou a ser a minha, e a violência é má, matar é mau, blá blá, sabemos isso tudo, mas por vezes, em certas e determinadas situações, não há outra forma!

A vingança consome o ser humano, não haja dúvidas, mas... e quando não sobra absolutamente mais nada? Quando chega uma altura em que já não se têm absolutamente mais nada a perder?

TRAILER
Porque acham que há tanta gente viciada - e até fanáticos - por esta cultura que é os super-heróis e vilões? O motivo pelo qual gostamos de vigilantes, vingadores, um pouco de anarquia neste mundo que é ilusoriamente democrático? Há literalmente convenções em todo o mundo deste universo fantástico... precisamos de saber que há alguém acima da lei que nos possa ajudar, que não seja politicamente correcto, que enfrente a sociedade, que faça alguma coisa, que nos salve! E os vilões são um mundo, e muito apreciado, eu pessoalmente sou fã de vários vilões, sempre tive uma queda por eles, ou por personagens secundárias, personagens incompreendidas, diferentes, que passam despercebidas... não sei se acredito que haja alguém que nasça naturalmente cruel, há sempre uma história por detrás, e aprendemos muito com essas histórias... ou deveríamos aprender, mas não se vê grande coisa a mudar... até na própria bíblia há histórias de aniquilação humana por a sociedade se ter tornado corrupta, e após as aniquilações, novas oportunidades de recomeço, oportunidades essas que nunca são aproveitadas... a humanidade pode ser tanto o melhor como o pior que existe à face da terra, e normalmente nunca escolhe ser o melhor...
Este filme é como assistir a um acidente, é chocante de se ver, mas não conseguimos desviar o olhar... se não fosse por ser um filme que estivesse a ser tão polémico, e a cereja no topo do bolo foi o facto de o Joaquin Phoenix ser um grande vegan activista, algo que eu desconhecia, provavelmente eu não teria ligado nenhuma ao filme tão cedo, apesar de muitas das vezes as opiniões serem sobrevalorizadas, tudo o que dizem da interpretação do Joaquin é verdade, é uma interpretação de mestre, ele encarnou mesmo a personagem, a única vez em que me senti assim tão trémula após assistir a uma interpretação brutalíssima foi com o actor James McAvoy no filme Split - e continua a ser das interpretações mais brutalmente arrepiantes e fascinantes que já vi na vida e antes de ver este filme tinha sido, para mim, a melhor de todas, o Joker de Phoenix agora está no top 5 -, junto também com o Tom Hanks no filme Terminal Aeroporto.

Por acaso, de muitos vilões que eu gosto, o Joker é fascinante porque uma das suas maiores características é atirar críticas sociais a torto e a direito, daquelas que são verdadeiros murros no estômago, diz sempre tudo o que tem a dizer, sendo que sofre com o "perdeste a razão quando te viraste para a violência", mas de que outra forma seria ouvido? Até o Gandhi fez greve de fome para se fazer ouvir, por vezes, não há outra forma, temos de fazer barulho, de chocar, para que nos ouçam...

Que não haja dúvidas também de que as doenças de foro mental são muito desprezadas e pouco compreendidas, ainda hoje quando digo que já estive internada com uma depressão e esgotamento gravíssimos, muitas pessoas associam logo à loucura ou esquisitice, à aberração, ao estranho e pouco natural,... e é essa a incompreensão da nossa sociedade que levam as pessoas à loucura, ou a desistir da vida... no meu caso, foi um desgosto muito grande entre outras complicações pessoais e profissionais, e quem me curou não foram os médicos nem o internamento, foi a minha força de vontade, porque os comprimidos que nos enfiam goela abaixo, fortes de tal forma que até nos fazem esquecer quem somos, e passamos a ser apenas assombrações no mundo não são a resposta, o facto de tratarem todos os doentes da mesma forma institucional também não, por isso, ou temos uma força de vontade e coragem astronómicos, ou estamos fu**dos...
Uma das situações que me causou mais impacto foi o realismo do seu riso e sorriso, e a forma como um sorriso/riso pode ser tão devastadoramente triste... especialmente a sua condição patológica que o faz ter ataque de risos em alturas extremamente impróprias, um riso misturado com muita dor, lágrimas e sofrimento...

Se toda a gente se queixa de que vivemos num mundo corrupto, porque ninguém faz nada para o mudar?... Oh, well... put on a happy face....

A interpretação de Phoenix é memorável, mas o filme em si, sinceramente nem por isso, de facto, estive quase para desistir no início, o que me manteve agarrada ao ecrã foi mesmo a intensidade de Phoenix, de resto grande parte do filme é lento e melodramático, só mais para o fim é que finalmente começa a acção e a emoção, o ritmo mais acelerado que eu aprecio, ... no entanto, este filme está direccionado para a condição humana e crítica social, e não para a acção que eu estava à espera, e nisso conquista bem o seu lugar! 

Uma coisa aposto convosco: vai haver IMENSOS Joker´s nas Comic Con este ano... Phoenix honrou sobremaneira a memória que Heath Ledger deixou do Joker....
(Joker): Não tenho mais nada a perder. Já nada me magoa. A minha vida é uma mera comédia. A comédia é subjectiva. Não é o que se costuma dizer? Todos vós, o sistema que sabe tanto, decidem o certo e o errado. Tal como decidem o que tem ou não piada! (...) Hoje em dia, todos são terríveis. É quanto basta para fazer alguém enlouquecer. (...) Se eu estivesse a morrer no passeio, passavam-me por cima! Passo por vocês todos os dias e não reparam em mim. Já ninguém é educado. Ninguém se põe no lugar do outro. Acha que homens como o Thomas Wayne pensam como é ser alguém como eu? Ser outra pessoa? Não. Pensam que ficaremos parados a aguentar, como meninos bem comportados! Que não nos vamos revoltar e atacar! (...) O que se tem... quando se cruza um doente mental solitário com uma sociedade que o abandona e o trata como lixo? Eu digo-lhe! Tem o que merece!

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